terça-feira, 18 de janeiro de 2011

TRABALHO ACADÊMICO SOBRE MARCELO NOVA( Itamar Campos Ramos publicou um trabalho baseado no Galope do Tempo na Universidade Estadual da Bahia. )

29/12/2010




TRABALHO ACADÊMICO SOBRE MARCELO NOVA PARTE I







O fã Itamar Campos Ramos publicou um trabalho baseado no Galope do Tempo na Universidade Estadual da Bahia. Agradecemos de antemão ao Itamar pela colaboração e parabenizando pelo trabalho.





O galope do tempo: Uma visão sobre a vida e a morte no pensamento e linguagem de Marcelo nova.



Itamar campos Ramos* Juliana Rafaela Tiago Antunes Feitoza Lícia Sobral**

RESUMO: Este artigo pretende apresentar, em linhas gerais a linguagem e pensamento de Marcelo Nova, ex-integrante do grupo musical camisa de Vênus, através de seu álbum o Galope do Tempo. A partir do estudo do álbum com os elementos da analise do discurso, busca-se compreender a visão de Marcelo sobre a vida e a morte. Discorrendo sobre seu processo ideológico e seu lugar de discurso.



O sujeito não é considerado como um ser individual, que produz discursos com liberdade: ele tem a ilusão de ser o dono de seu discurso, mas é apenas um efeito do ajustamento ideológico. O discurso é construído sobre um inasserido, um pré-construído (um já-lá), que remete ao que todos sabem, aos conteúdos já colocados para o sujeito universal, aos conteúdos estabelecidos para a memória discursiva.¹



PALAVRA CHAVE: Pensamento, Marcelo nova, O Galope do tempo, Linguagem, Mídia, Ideologia.



Um homem que tem algo a dizer e não encontre ouvintes está em má situação, mas pior ainda estão os ouvintes que não encontrem quem tenha algo a lhes dizer.(Bertolt Brecht)







Sei que não posso vencer, mas o meu coração não se rende. Bob Dylan (Time Out Mind, 1991)







INTRODUÇÃO



Marcelo Drumonnd Nova nasceu na Bahia, mais precisamente em salvador, no dia 16 de agosto de 1951. Filho de uma família de classe média.







* Discentes do curso de Letras, turma 2008.2, Universidade do Estado da Bahia - Departamento de Ciências Humanas e Tecnológicas - Campus XVI – Irecê - BA.



**Professor Orientador



Nova, Marcelo. O galope do tempo. Disco; Copy ryght 2005,



¹(GREGOLIN, 2003:27)







Logo muito cedo tem contato com uma arte que transformaria toda a sua vida, chamada rock and roll. Um dia passeando por uma rua de salvador com seu pai ele ouviu um som que ele acompanharia por toda sua vida. Era Litlle Richards, gritando os sons iniciais de tutti frutti, um clássico do rock. A partir desse dia o menino não foi mais o mesmo. Impressionado com o poder estético e sonoro do rock and roll Marcelo sonha em ter uma banda, sonho que vem se realizar nos anos 1980 com a formação do camisa de Vênus. "Eu costumava tocar guitarra com a raquete de tênis do meu pai quando tinha apenas oito anos de idade. Eu queria ser Elvis, Jerry Lee, Little Richard, depois queria ser John Lennon, Mick Jagger, Keith Richard, Eric Burdon. Eu botava os compactos e fazia dublagem sem saber nada de inglês, ia só no som, sabe aquela... "I want by not you love me, I dont understand... Is very much" entendeu? Então a idéia de montar uma banda me acompanha desde que eu era bem pequeno. Mas morando na Bahia eu achava que isso era impossível, pois quando comecei a trabalhar para comprar meu próprio instrumento, o meu conceito de banda na época era Led Zeppelin, Deep Purple e eu imaginava que era preciso toda aquela parafernália para se ter uma banda. Aí veio o Punk Rock e deu no que deu."







A BAHIA DO CAMISA DE VÊNUS



Nos anos 80 o mundo passa por varias transformações sociais e o Brasil vive o processo de redemocratização através da abertura política. O povo voltava a escolher seus dirigentes e os exilados políticos retornavam ao país. Enquanto a economia passava por um momento catastrófico com uma inflação exorbitante. O rock surge no Brasil com uma moda com as bandas do eixo rio-São Paulo( ultraje-a-rigor,Ira!, Blitz,etc)¹ tomando conta do cenário com um discurso carregado de ingenuidade. O camisa de Vênus formado na Bahia fora do grande eixo vem como um trem na contramão arrasando tudo. A Bahia é identificada pela mídia como um paraíso tropical e místico. Enaltecida pelos artistas da terra como Dorival Caymmi, Caetano Veloso, Gilberto Gil sendo cantada em verso e prosa como a terra do axé. Camuflando a miséria e a violência na qual esta envolvida grande parte da população. Com 80% de um povo negro morando em periferias, e distantes de saneamento básico e com uma educação precária. O que se vê nos meios de comunicação é um estado de alegria e felicidade. O Camisa de Vênus surge como uma voz de denúncia e desmascaramento da sociedade baiana. Logo no lançamento de seu 1º compacto Marcelo nova na canção Controle Total canta: “aqui em salvador a cidade do axé, a cidade do horror”. A mentira velada caindo por terra, pois seu discurso vem de alguém que esta dentro dessa cultura. Alguém que vê o que se passa e a compreende e a revela, assinalando que o Brasil não passa de uma grande Salvador.



O sujeito é um individuo concreto, que se constitui na interação social. E esse o lugar de sua pratica. Ele recebe pelo processo social da educação; através do sistema de valores no qual ele e banha e que é fortemente marcado pela classe social ou pelo nível socioeconômico a que pertence. [...] ²



²BACCEGA, Maria Aparecida. 2003 p.11







Na mesma canção acima citada, Marcelo Nova demonstra o poder da mídia sobre os meios de comunicação: “levante vá tomar café é hora de trabalhar, mas se quiser ligar o radio tem musica feita pra lhe encenar”. Profeticamente vendo o que se tornaria a indústria fonográfica que seria produzida na Bahia. Com uma profunda consciência critica Marcelo nova desafia o Establishment a frente de sua banda expondo toda uma produção baseada no interesse financeiro imediatista.



O ato de fala, individual e único, consiste, na verdade, na apropriação de um processo coletivo _o indivíduo/sujeito apropria-se da cultura que encontra; origina se nesse processo e a ele retorna quando é manifestado. E nesse retorno o indivíduo/sujeito poderá estar “reproduzindo” e o que já estava, ou inovando![...] 3





Após tocarem para um publico de 20 mil pessoas no farol da barra, o Camisa de Venus parte para a gravação de seu 1º LP em são Paulo. Com o lançamento do disco a gravadora sugere a mudança de nome da banda, por ser um nome agressivo e que não cabia a sua divulgação pela mídia. Marcelo Nova responde ironicamente que o nome será mudado para “capa de pica”.



Esses discursos de mascaras são emitidos um sem numero de vezes, reiteran-se, tornam-se estabelecidos. A linguagem então assume o papel de mercadoria. Ela vale tanto mais quanto esteja de acordo com o estabelecido, com o conveniente, com a manutenção do estatus quo. É a sociedade das aparências. [...] 4



Expulsos da gravadora Som Livre, o Camisa de Vênus vai sobrevivendo através dos shows, até conseguir pela RGE a gravação do segundo disco, Batalhões de Estranhos em 1984. No qual está a canção que os torna conhecido em todo o pais, Eu Não Matei Joana D`arc. Levando a banda a vender 100 mil copias. O Camisa de Venus tem uma história de conflitos e rebeldia que torna a sua marca registrada, com um discurso totalmente desconcertante de Nova a banda superou todos os entraves e empecilhos pelo caminho. Lançando mais três álbuns ate a banda terminar com sua formação original: Viva(1986) correndo o risco(1986) o Duplo Sentido(1987). Ressaltando que o disco Viva gravado ao vivo em santos estava recheado de palavrões, com a platéia gritando em uníssono: “Bota pra Fuder”. Um marco na cultura brasileira. Trazendo a realidade da linguagem das ruas como o teatro de Plínio marcos, na peça Dois Perdidos Numa Noite Suja. Com o fim do Camisa de Vênus Marcelo nova parte para a carreira solo. Lançando álbuns de pura beleza artística como: Marcelo nova e a Envergadura Moral (1988).



3 BACCEGA, Maria Aparecida. 2003 p.32



4 Idem, 2003.p.32



Marcelo Nova ainda voltaria a fazer shows e a gravar com o Camisa de Vênus em 1995 lança o álbum Plugado e Quem é Você(1996) com Raul seixas A Panela do Diabo(1989) Blecaute (1991), o primeiro álbum totalmente acústico do mundo. A sessão sem fim (1994), Eu Vi o Futuro Baby, Ele é Passado (1998) e o majestoso O Galope do Tempo (2007)



A identidade do sujeito é um efeito do poder. “A identidade, assim como o sujeito, não é fixa, ela está sempre em produção, encontra-se em um processo ininterrupto de construção e é caracterizada por mutações” [...] 5





Escrito por Xande Campos Capitão às 12h45

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TRABALHO ACADÊMICO MARCELO NOVA PARTE II





O fã Itamar Campos Ramos publicou um trabalho baseado no Galope do Tempo na Universidade Estadual da Bahia no campus XVI, que fica em Irecê-Ba.



Agradecemos de antemão ao Itamar pela colaboração e parabenizando pelo trabalho.



O Galope do Tempo



O álbum lançado em 2007, O Galope do Tempo apresenta um Marcelo nova com elucubrações sobre existência humana, como Bob Dylan no álbum Time Out Mind. Nas palavras do próprio Marcelo:” Esse é um disco que diz respeito ao tempo e a minha passagem através dele. Custou-me 13 anos desse tempo precioso para concluí-lo em meio a essa jornada do útero ao caixão.”



O disco inicia-se com o vento soprando. O vento como sendo a única coisa que permanece. Os fenômenos se manifestam e depois desaparecem seguindo o ciclo natural da existência. Na canção Fecundado, apos ter visto seu filho através do ultra-som. Eu vi um ponto de luz pulsando no escuro/ Sem fome sem nome aceso sinalizando o futuro. Nova reflete sobre o processo da vinda de existência do ser. Numa visão existencialista o ser será lançado, cuspido num mundo no qual terá que transformá-lo, torná-lo mais significativo para si.



O tempo passa e em sua passagem vai deixando suas marcas no corpo, na alma em tudo que nos circundam. Há uma percepção quase direta das transformações que sofrem as coisas num grande espaço de tempo, mas quando se trata da mudança em unidade de tempo mínima é quase imperceptível, como no caso de um ser que ao nascer já começa seu definhamento. Na canção o Galope do Tempo que traz em si o nome do álbum, Marcelo nova discorre sobre o tempo em sua trajetória cronológica, trazendo o processo político do mundo, como a guerra, fome, a peste e a morte.



Ao nascer, o homem encontra, portanto, uma história em processo. É como se tomasse um trem em uma determinada estação. Esse trem que carrega a cultura está vindo de muitas e muitas estações. Já transportou milhões e milhões de pessoas entre as varias estações 6

5 FERNANDES, 2005, p. 43

6 BACCEGA, Maria Aparecida. 2003 p.30







Aí vai o galope do tempo no seu corcel alado/Sua trilha, caminho, nosso rumo e destino seu significado/ Vamos tentando encontrar algo que justifique esse estranho legado/ Com a vida e a morte pulsando entre as patas e cascos desse corcel alado. Fatores que sempre aparecem arraigados na natureza do tempo ou como diz o eclesiastes: há tempo para todo o propósito debaixo do sol. A infância é lembrada por Marcelo nova, relatando a sua vida e a relação com seus pais, os primeiros namoros e o contato com os discos de rock na canção outubro de 65: Então logo ia dormir meus discos e desejos espalhados no chão/Sonhava com uma namorada e beijava o travesseiro na escuridão. Mas desde tenra idade a morte parece trazer em sua mente algo que não pode ser simplesmente ignorada: se meu cachorro morreu atropelado/ vai ver que também foi por vontade de Deus. Levando-o a questionar sobre a vida e seu surgimento nesse mundo e a existência de Deus.



“a palavra discurso, etimologicamente, tem em si a idéia de curso, de percurso, de correr por, de movimento” (). Os discursos se movem em direção a outros. Nunca está só, sempre está atravessado por vozes que o antecederam e que mantêm com ele constante duelo [...] 7







Na canção Ninguém Vai Sair Vivo Daqui Marcelo entra na adolescência e tem contato com os livros de adouls Huxley, do qual ele cita as portas das percepções, livro que trata da experiência do autor com a mescalina. Nova vê na arte a transformação de sua visão do mundo: Já faz tanto tempo eu tinha 16/ ele caiu na minha eu li pela primeira vez/ Um livro tão estranho me chamou a atenção/ Mr.huxley me abriu as portas da percepção/ Surgiram novos horizontes, tanta possibilidades/ Encontrar o meu caminho, a busca da verdade/ E talvez a mais simples que eu logo aprendi/ É que ninguém vai sair vivo daqui.A vida como sendo única e sem retorno, leva Nova a analisá-la e tentar vive-la intensamente. Também daí se manifesta uma visão critica do mundo: O tempo passou, mas depressa que eu pensei/ O que era uma exceção agora parece ser lei/Gente bebendo chuva, pessoas comendo lixo/ Dormindo nas calçadas crianças virando bicho. A mídia é denunciada como alienadora e mantenedora do Establishment. Diz Nova: "Um fato desagradável é que a mediocridade está definitivamente instaurada na sociedade contemporânea como um vírus, para o qual ainda não há cura.



A linguagem provoca posturas aparentemente dicotômicas: ou uma entrega total ao que se esta “recebendo” – credulidade- ou uma reserva muito grande –reticência. Segundo Lefebvre no primeiro caso temos os ingênuos e no segundo os desconfiados [...] 8

7 ENI P. orlandi, 1999, p. 15

8 BACCEGA, Maria Aparecida. 2003 p.3







Escrito por Xande Campos Capitão às 12h41

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TRABALHO ACADÊMICO SOBRE MARCELO NOVA PARTE III











A mediocridade hoje é aceita, às vezes, aplaudida, outras vezes protegida, mas acima de tudo ela tem sido incentivada. Só ha dois fatos irreversíveis no mundo contemporâneo: A morte e a mediocridade. Com a clonagem só restará a mediocridade”. E a canção segue: No rádio uma canção feita pra anestiar/ Enquanto a voz lá do planalto parece comemorar.







Em Dois Passos Pra Frente e Um Para trás, nova percebe a mudança de todos os fenômenos manifestos e as mudanças que passa dentro de si mesmo: o tempo vai voando, sai o ano entra o mês/ tudo vai mudando, então muda outra vez/ eu já não sou o mesmo, você esta tão diferente/ tudo vai mudando, então muda novamente.



O tempo vai seguindo em sua linearidade deixando suas marcas, lembranças, tristezas e alegrias. Há uma visão ao passado e por tudo e todos que compõe o conjunto de sua vida.

O individuo sujeito apropria - se da cultura que encontra; origina se nesse processo e a ele retorna quando é manifestado. E nesse retorno o individuo sujeito poderá estar “reproduzindo” o que já estava ou inovando [...] 9







A Balada do Perdedor é uma canção onde nova expõe o mundo artístico no qual ele estava inserido e que lhe foi oferecido, um mundo de luzes e fantasias no qual as trevas de sua cruel realidade é disfarçada. Nova renega esse mundo compreendendo a escravidão e as algemas que prende os artistas aos quais por ele estão fascinados. São como insetos que encontram sua destruição ao ir em direção a luz. A liberdade do processo criativo é a primeira das dignidades artística que se perde, o artista se torna uma marionete, não podendo exercer suas reais potencialidades. A noite parece tão promissora, luzes por todo o lugar/decote sorrisos, sussurros, cheiro de conquista no ar/ E eu aqui sozinho, tentando fazer esse isqueiro funcionar/ Parado em frente a porta do paraíso, mas sem vontade de entrar. A idéia do isqueiro sugere a possibilidade de provocar, causar, instigar um mundo que esta dormindo no profundo sono da letargia e ignorância.



A ideologia só existe na prática social. Ela se constitui num sistema de valores, pleno de representações, de imagens - modo de ver o mundo, modo de ver a sociedade, modo que o homem se vê a si e aos outros . Enfeixa os pontos de vista dos homens que vivem num determinado grupo, classe social ou nação. Tem o poder de “condicionar as atitudes dos homens” e levá-los a praticar ( ou considerar que praticam) ações que eles consideram as mais adequadas para não se desviar desse sistema de valores. Mostra-se coerente sistematizada, o que lhe garante sua força. [...]10



9 BACCEGA, Maria Aparecida. 2003 p.32



10 Idem, 2003 p.34







A amizade, o amor, a lealdade é tratada em Angel que revela uma canção de lamento sobre uma luta solitária contra o que está duramente estabelecido. Retrata uma amizade que atravessou ventos, mares revoltosos tempestades. Mas que ficou perene no coração. Uma amizade que jamais será esquecida: Mas não há luz suficiente/ em toda essa escuridão/ Que possa varrer suas sombras/ Dos cantos do meu coração/ Oh! Angel.



Esse anjo que não nos aparece tão claro na canção de Marcelo de quem seja. Faz nos lembrar no decorrer da letra de Raul seixas, parceiro que viveu com Nova momentos tão intensos e vibrantes e dolorosos. A força da vitalidade vai se desvanecendo aos poucos, a capacidade da resistência aos ventos impetuosos não é mais a mesma: Houve um tempo em que não havia/ Vento capaz de te levar/ Nem no olho do ciclone/ Nem nos grandes lábios do mar. Lembra Raul quando já debilitado de saúde e cansado da luta “da espada de Ivanhóe contra o raio laser do sistema”. Marcelo faz um remake de tudo vivido e afirma que o que permanece é a intensidade do que foi vivido: M o castanho dos seus olhos/ outros olhos irão guardar.



Impossível é moldar uma forma que defina o sujeito sem essa relação que trava com o outro. Fernandes afirma que “compreender o sujeito discursivo requer compreender quais são as vozes sociais que se fazem presente em sua voz” [...] 11







Mas o coração fala mais alto e a rebeldia é tida como uma redenção em Vamos Passando. A solidão se torna a marca que separa o que é incomum do que é trivial e repetitivo: Algumas vezes calados/Fazemos tanto barulho/’’As vezes tão solitário pra sentir orgulho. As dificuldades da vida se manifestam e não há um esquivamento fugidio, mas simplesmente uma maneira de se defender melhor: algumas vezes entorta/ outra vezes dá certo. Pois a luta, é parte natural da vida. Temos que lutar e não importa se vamos vencer ou não. Mas temos que encarar a vida e torná-la mais significativa. Como diz Nova: “O que importa é estar no ringue”.



A morte esta a nossa frente a todo o momento e não há nenhuma maneira de escapar, os verdadeiros valores da vida se contrapõe ante as ilusões com as quais consumismos nossas vidas. O que vale apena a ser feito e o que não, Marcelo propõe em Poeira no Chão: Nós dançamos num telhado/ Que vai um dia desabar/ Os anéis saem dos dedos/ e os ossos vão secar/Sua carne apodrecida logo um verme vai comer/ Pergunte ao rei ou ao mendigo eles logo vão dizer.







11 FERNANDES, Cleudemar. 2005, p.35







Todos os fatores levam a morte e nenhum nos fará manter vivos. Mesmo nessa certeza, nessa inevitabilidade é necessário um olhar sobre a vida e não nos lançarmos num desespero hedonista, pois o prazer desenfreado esta carregado de dor.



“possuir e conservar tudo quanto lhe propicie alegria e afastar e excluir tudo quanto lhe traga tristeza”“o que fortalece e foge do que enfraquece” [...] 12







Em Inez dorme nova adentra o mundo feminino no qual a mulher consegue subtrair-se dos problemas cotidianos mais gritantes. Não como um ser alienado, distante da realidade, mas como um ser capaz de isolar-se de penetrar-se em si mesmo, como uma tartaruga que recolhe seus membros. O mundo empenou na tela da televisão/ Deu tudo errado, derrapou parece não ter jeito não/ Mas só a dois palmos do chão Inez dorme.







[...] “uma representação’ imaginária dos indivíduos em suas condições reais de existência” [...] 13







A citação de seus ídolos sempre foi uma constante na obra de nova, seus primeiros álbuns já estavam pontuados de pessoas que ajudaram a construir sua personalidade como Bob Dylan, Oscar Wilde, em O Fantasma de Luis Buñuel, Nova expõe a provocação como uma das funções básicas da arte; Se a evidências não tivessem caído maduras/ É muito provável que você as tivesse negado. Marcelo nova sempre viu a arte como uma forma de transformar a realidade, de desmascará-la. Marcelo nunca soou com uma voz uníssona, fez seu caminho a margem, fora do oba-oba artístico: Tão em cima dos trilhos e no entanto tão fora do tom.



Como categoria constitutiva da ideologia, será somente através do sujeito e no sujeito que a existência da ideologia será possível [...]14







13 ALTHUSSER, 1983, p. 85

12 CHAUI, M. CHAUI, 2003

14 ALTHUSSER, apud BRANDÃO1994, p. 23







Escrito por Xande Campos Capitão às 12h36

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TRABALHO ACADÊMICO SOBRE MARCELO NOVA PARTE IV







Diante de um sentimento de perplexidade, de vazio, Nova em a Torre Escura expõe um mundo em que nada consegue comove-lo: Confiro meus bolsos vazios/Em busca de algo que não sei o quê/ Não sinto fome, sede/Não sinto nada/ Não há nenhuma lua no céu/ Nem chuva, nem Venus, nem fogo/ Que ilumine a pequena torre.



Ideologia não é nem representação e nem ocultação da realidade. “Ela é uma prática significativa. Necessidade da interpretação, a ideologia não é consciente: ela é efeito da relação do sujeito com a língua e com a história em sua relação necessária, para que se signifique” [...] 15







Na canção o Sonho Nova demonstra um profundo encantamento pelo mistério da existência: Quando lhe encontrei não acreditei/ Pois você não existia/ Como pode a ciência tentar/ Explicar tamanha bruxaria/ Esse pequeno invasor na noite/ Do ventre vir a tona um dia. E vê o prolongamento da sua existência nos traços de seu filho: E quando já não puder ver, por seus olhos enxergarei/ E quando já não puder dizer, pela sua boca falarei/ Equando já não puder tocar, com seus dedos sentirei/ E quando já não mais existir em você eu estarei.



O que define de fato o sujeito é o lugar de onde fala. Foucault diz que “não importa quem fala, mas o que ele diz não é dito de qualquer lugar” [...] Esse lugar é um espaço de representação social (ex: médico, pai, professor, motorista etc.), que é uma unidade apenas abstratamente, pois, na prática, é atravessada pela dispersão. [...] 16





Em o Deus de Deus nova questiona a divindade cristã e a rebeldia do homem em relação à mesma. Pois se algo existe deve ter sido criado: os animais acharam que seu Deus não era justo. Na visão de Nova o mundo no qual os homens estão inseridos não há um Deus, nessa visão existencialista o homem é cuspido, num mundo hostil sem ninguém para defendê-lo. E na sua jornada o homem vai transformando e moldando seu caráter de acordo como compreende e relaciona-se com esse mundo.



Fernandes, “a constituição do sujeito discursivo é marcada por uma heterogeneidade decorrente de sua interação social em diferentes segmentos da sociedade” [...] 17



15 ENI P. orlandi. 1996, p.48



17 FERNANDES, Cleudemar. 2005, p. 41



16 FOUCAULT, Michel. 2005, p. 139



Em Fim de Festa, há prenuncio do fim da vida. Uma preparação para a despedida. Um balanço geral. Alguns arrependimentos e afirmações: Às vezes não é bom lembrar/ De algumas escolhas que fiz/ O fantasma das decisões erradas/ Sempre fez pouco de tudo que eu quis.



O sentido de uma palavra nasce apartir de novas teorias, de novos conteúdos - de novas ações humanas. Enfim. Essas novas ações brotam a cada momento no cotidiano, muitas vezes num processo lento, outras vezes rapidamente de acordo com o momento histórico [...] o novo é sempre resultado do que já era. [...] 18





O álbum encerra com a canção da morte, sempre companheira a morte enfim nos enlaça. Há certa tristeza, mas também uma profunda compreensão de que a morte esta atrelada a vida. Não há uma negação pueril, mas há aceitação da morte como um complemento da vida. A morte esta inerente a todos: Hei pai-morte estou voando pro ninho/ Nesta noite fria estou tão sozinho/hei velho pai sigo seu caminho/ Irmao-morte não chora mais nada/ Minha mãe também já descansa calada/ Cavalheiro morte, por favor, traga a espada.







Assim foi dito por Budha, O iluminado: O que nasceu há de morrer,



O que foi reunido se dispersará, O que foi acumulado há de se esgotar, O que foi construído há de ruir. E o que foi elevado há de baixar.



“Minha religião é viver-e morrer- sem arrependimento”.



Milarepa.19







Considerações finais



O álbum o galope do tempo é um disco contundente e relevante dentro da cultura brasileira. É um disco conceitual e coerente, com inicio, meio e fim. Marcelo nova faz todo o trajeto da vida até a morte. Fora dos padrões midiáticos imediatistas. Nova se mantêm como uma voz, uma atitude. Distante do curral limitado do atual cenário artístico. Nova se torna um artista único, revolucionário, portador de um discurso tocante e desconcertante. Marcelo Nova é o ultimo dos moicanos, o sobrevivente em um país alastrado por uma felicidade e alegria demente. Em suas próprias palavras: Novos dogmas são planejados/Velhos anseios são adaptados/O tecno-fascista mostra o caminho/Siga a matilha ou vai morrer sozinho/ Tudo tão legal de admirar/ tudo alto astral/ acho que vou... Vomitar.







18 Ananda k. Coomaraswamy. 1967



19 BACCEGA, Maria Aparecida. 2003 p.32



20 Rinpoche, Sogyal. 2003 p.30







Referências



ENI P. orlandi. análise de discurso:princípios e procedimentos.



Campinas São Paulo Pontes, 6° Ed. 2005







ALTHUSSER, L. Aparelhos ideológicos de Estado:



nota sobre os aparelhos ideológicos do Estado. Rio de



Janeiro: Graal, 1983.



BACCEGA, Maria Aparecida. Palavra e discurso. 1. Ed. São Paulo: Ática,2003



BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução a análise do discurso. São Paulo: Editora da Unicamp, 1994.



Cabral dos (Orgs). Teorias Lingüísticas: problemáticas contemporâneas. Uberlândia, EDUFU, 2003



CHAUI, M. Política em Espinosa. São Paulo:



Companhia das Letras, 2003.



FERNANDES, Cleudemar. Análise do Discurso: reflexões introdutórias. Goiânia: Trilhas Urbanas: 2005



FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. ed. 5°. São Paulo: Loyola, 1996. A arqueologia do Saber. ed.7°. Tradução Luiz Felipe Neves. Rio de janeiro: Forense Universitária, 2005.

GREGOLIN, Maria do Rosário Valencise. Análise do Discurso: Lugar de



Enfrentamentos Teóricos. In: FERNANDES, Cleudemar Alves; SANTOS, João Bosco



Rinpoche, Sogyal Livro tibetano do viver e do morrer. Ed. Clara luz. 2003



NOVA, Marcelo. O galope do tempo. disco; Copy ryght 2005,



ORLANDI, Eni P. Interpretação: Autoria, Leitura e Efeito do Trabalho Simbólico.



Petrópolis: Editora Vozes, 1996.



SILVIO, Essinger. Punk: anarquia planetária e a cena brasileira. 1. Ed. Rio de janeiro: 34 ltda, 1999.



Ananda k. Coomaraswamy. o pensamento vivo de Buda. 7 ed. São Paulo: Martins editora.1967





















Escrito por Xande Campos Capitão às 12h32


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domingo, 9 de janeiro de 2011

PENSAMENTO...........






"SOU APENAS
A PORRA
D'M GRAO DE ARE!A
.
 NUM VENDAVAL
DE 1
 MUNDO
EMPOE!RADO"
 !!!

 (c.p.b.p.jr:)








quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

(COMO NUM D!A, COMO HOJE)

(como num dia , como hoje)



EU HOJE EST!VE
EM ALGUMA PARTE
(ALGUM LUGAR DO PASSADO)
PROCURE!
DESESPERADAMENTE...
ME ENCONTRAR
PENSSE! Q EU A!NDA
ESTAVA LA
SERA Q ESTOU
? PQ EU NAO ME ENCONTRE! ?
SERA Q SERA
SERA Q POR CERTO
AMANHA D!STANTE
DE ALGUM FUTURO
EU A!NDA ESTARA LA
POR ONDE ANDARA
1 DE CADA EU PEQUEN!NO
DEPRESSA F!G!NDO DESMEMOR!ADO
PERALTA A CANTAR S!LV!A
OU GR!TANDO BOTA PRA FUDE...
NUM GR!TO PR!MAL
COMO NUM
D!A COMO HOJE.


-c.p.b.p.jr: (POETA-MATUTO-MARG!NAL !!!)

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

FILOSOFIA NO BRASIL (POR RINALDO DE FRANÇA LIMA)

Filosofia no Brasil


EXISTE OU NÃO FILÓSOFOS E/OU FILOSOFIA BRASILEIROS?



Resumo: Com o presente e curto ensaio monográfico eu pretendo demonstrar que existem filósofos brasileiros; existe uma filosofia feita no Brasil e de qualidade reconhecida; que não existe uma filosofia genuinamente brasileira dentro dos modelos tradicionais, mas que o quadro vem mudando nos últimos tempos e podemos vislumbrar um futuro promissor para a história do pensamento brasileiro. O método que utilizei foi o da simples pesquisa de nomes de peso na história da filosofia brasileira, aliado ao meu próprio modo de filosofar, que é o de fazer anotações no meu dia a dia.



INTRODUÇÃO



Engana-se quem pensa que não há filosofia no Brasil e, em conseqüência, que não há filósofos. Não se pode falar de uma tradição, eminentemente brasileira, num país tão jovem quanto o Brasil. Seria, talvez, um contrassenso exigir de nosso país uma filosofia nos moldes da grega, alemã, inglesa ou francesa, quando forçosamente temos que considerar a história milenar dessas civilizações. Não estariam os nossos teóricos exagerando ou exigindo de nós brasileiros, do ramo, uma produção filosófica própria além daquela que podemos efetivamente oferecer? O pensamento de uns não pode ser tomado de forma dogmática e... Ponto final. Não! Ninguém é detentor da verdade. Uma pessoa não pode conhecer todas as pessoas que pensam, escrevem e publicam num país. Muito menos conhecer todas as obras publicadas.



NOMES DE PESO NA HISTÓRIA DO PENSAMENTO BRASILEIRO



Muito embora não possuamos uma tradição filosófica intrinsecamente brasileira, o pensamento filosófico brasileiro já começa a tomar corpo a partir do século XVIII, passando por sucessivas mudanças até chegar aos dias atuais. Sabe-se, por exemplo, que durante todo o século XIX uma doutrina foi difundida no Brasil, abrigando grandes nomes, a exemplo de Benjamin Constant, Miguel Lemos e Teixeira Mendes, o positivismo. Por volta da metade do século XIX, correntes evolucionistas e culturalistas encontraram aqui no Brasil renomados representantes, como por exemplo, Tobias Barreto e Silvio Romero, ambos naturais do Estado de Sergipe, sendo o primeiro partidário do culturalismo e o outro do evolucionismo de Spencer. Daí, podemos inferir que um pensamento não nasce adulto, pronto. Tal analogia pode ser aplicada tanto ao pensamento de um indivíduo, quanto ao pensamento evolutivo de uma sociedade, no caso em estudo a sociedade brasileira. Ele precisa de tempo para ser maturado.

Da lavra de Tobias Barreto (1839-1889) podemos citar suas “Obras Completas”, editadas pelo Instituto Nacional do Livro, nas quais estão inclusos os seguintes títulos: “Ensaios e Estudos de Filosofia e Crítica” (1875), “Brazilien wie ES ist” (1876), “Ensaio de pré-história da literatura alemã”, “Filosofia e Crítica”, “Estudos Alemães” (1879), “Dias e Noites” (1881), “Polêmicas” (1901), “Discursos” (1887) e “Menores e Loucos” (1884).

De Silvio Romero (1851-1914), entre outras obras, merece destaque: “A filosofia no Brasil”, obra que viria causar grande polêmica com seu condiscípulo Souza Bandeira. Infelizmente, não tive como ir além na pesquisa sobre Souza Bandeira, visto que o autor pesquisado não dá mais detalhes sobre o personagem. Para habilitar-se à cadeira de Filosofia do Colégio Imperial Pedro II, Sílvio Romero defendeu a tese “Da interpretação filosófica na evolução dos fatos históricos”, tendo logrado aprovação. Em 1894 publica obra de crítica ao positivismo, intitulada “Doutrina contra Doutrina” e no ano seguinte publicou os “Ensaios de filosofia do direito”.

Um nome não pode deixar de ser citado: Raimundo de Farias Brito, tido como um dos filósofos brasileiros de grande prestígio e originalidade. Nascido em São Benedito, Ceará, em 1862, entre várias de suas obras podemos destacar “A Filosofia como Atividade Permanente do Espírito Humano” e “Finalidade do Mundo”, obras onde o autor demonstra um incansável esforço em busca da verdade. Entretanto, em sua época eram escassos os leitores para assuntos filosóficos, fato que se prolonga até os nossos dias, o que não significa que não tenhamos filósofos no Brasil e, mais, que esse quadro negativo venha experimentando uma evolução positiva a cada dia. E se não existem leitores, ou autores, que se disponham ao debate, que culpa tem o filósofo? O filósofo existe, é óbvio, já o debate...! É outra história! Podemos não ter, como dito linhas acima, uma filosofia genuinamente brasileira, mas filósofos temos, sem dúvida.

Para Farias Brito, a Filosofia é um trabalho constante que o espírito assume no sentido de ver o mundo em sua totalidade, dentro da qual a consciência desenvolve sua atividade. Para ele, consciência e espírito se identificam. É missão da Filosofia, segundo esse filósofo, trazer à luz o que está encoberto sob o manto da ignorância e se apresenta ao homem como um mistério. Podemos não esclarecer tudo, mas temos obrigação de pelo menos tentar esclarecer o melhor que pudermos. Em síntese, procura esse pensador desenvolver uma investigação de caráter próprio acerca dos principais temas filosóficos atrelados aos problemas existenciais: a verdade, a vida, a dor, a morte. Segundo Farias Brito, a moral é a finalidade última da filosofia. A filosofia, enfim, precisa atender as inquietações inerentes ao ser humano.

Outro nome igualmente importante surge no início do século XX: Leonel Franca, considerado um dos mais expressivos do pensamento filosófico brasileiro desse período. Desempenhou importante papel na restauração e renovação do pensamento tomista, frente às questões advindas das doutrinas materialista e espiritualista. Nascido em São Gabriel, Rio de Janeiro, em 1893, foi um sacerdote católico e professor brasileiro. De suas obras podemos destacar como as mais importantes: “Noções de História de Filosofia” (1918), “A Igreja, a Reforma e a Civilização” (1922) e “Pensamentos Espirituais”, publicados postumamente em 1949.

Dom Luciano José Cabral Duarte, aracajuano nascido em 1925, é arcebispo emérito de Aracaju, e merece entrar nesta lista de homens do pensamento brasileiro. De D. Luciano cito apenas uma obra: “La Nature de l’intelligence dans de thomisme e dans La philosophie de Hume” , tese de doutorado em Filosofia apresentada na Sorbonne. O texto completo está disponível na Internet no site “books.google”, em francês, e tem 387 páginas.

Antônio Paim, baiano, nascido em 1917, tem lugar de honra nesta galeria, pela importância de seu trabalho na arte do pensamento. Sua obra de vulto, “Bibliografia Filosófica Brasileira”, em dois volumes, foi publicada em parceria com Miguel Reale. Paim tem desenvolvido amplo trabalho de pesquisa e reedição de textos na área de filosofia brasileira, ou filosofia no Brasil, como queiram. O conteúdo de sua atividade de pesquisa pode ser resumido em três itens: a) Estudo da Filosofia Brasileira; b) Estudo do Pensamento Político Brasileiro; c) Estudo das Idéias Morais no Brasil.

Parafraseando um renomado historiador, cujo nome me foge à memória neste momento, recordo que dizia ele que o homem, por onde quer que ele passe, aí estaria a sua história, bem assim ocorre com o filósofo, o pensador. Dito com outras palavras, todo homem e toda mulher que possa pensar logicamente e que tenha como expor seus pensamentos de forma sistematizada, ordenada e produtiva, será um filósofo em potencial. Aí estará sua filosofia. Ou seja, se um homem consegue ordenar seus pensamentos e emitir juízos, então se tem aí um possível filósofo. Em qualquer lugar do mundo, todo homem e toda mulher pensa. E todos pensam de forma similar. O pensar de um homem brasileiro não é diferente do pensar de um Sócrates, de um Nietzsche, de um Freud, de um Darwin, etc. O que faz a diferença é o como ele ordena seus pensamentos, e o que pode oferecer em benefício dos seus semelhantes.

Para alguém defender que não existem filósofos ou filosofia no Brasil, seria preciso conhecer, amiúde, todas as obras do gênero publicadas, o que é tarefa das mais difíceis. Cobra-se tanto uma filosofia brasileira, genuinamente brasileira, o que pode parecer conter aí um certo exagero. Afinal, o Brasil é um país jovem, não possuidor da tradição dos alemães, ingleses ou franceses. Mas, será que num país onde a distância entre a fala e a escrita se amplia cada vez mais, não poderia ser este um dos motivos a impedir o desenvolvimento de uma filosofia genuinamente brasileira, tão cobrada? E mais, com os altos custos para o leitor brasileiro, não seria esse outro motivo impeditivo aos nossos filósofos de incrementar publicações? Certamente, outros motivos existem, entretanto sair numerando-os não acrescenta muito a este trabalho.

Outro ponto merece ser tratado com cuidado: os assuntos mais quentes, digamos assim, já podem ter sido discutidos exaustivamente ao longo dos séculos. E o Brasil, por suas peculiaridades históricas, e também por ser um país jovem, talvez não tenha condições, ainda, de, pelas lentes dos seus filósofos, enxergar motivos para levar adiante um projeto filosófico mais arrojado. Afinal, o pensamento humano já está praticamente, se não todo, “mapeado”, mas isso não significa que algo novo não possa surgir. Mas, como fazer isso? Buscando dentro de si próprio os seus limites. E como chegar a esse ponto? Com a reflexão. A reflexão pode ser, portanto, um ponto de partida para o filosofar. Filosofar é, a partir de uma reflexão profunda, defender uma perspectiva nova. Em qualquer lugar do mundo há filósofos. Viver já é uma condição para ser filósofo. Pensou, filosofou! Tudo começou quando o homem, ainda em projeto, ergueu os olhos para os céus e perguntou a si mesmo sobre os limites do universo. Este foi o início de todo o filosofar.

O que o Brasil precisa é procurar mudar esse quadro, não de uma hora para outra, mas num processo de longo prazo. Muita coisa precisa ser repensada, muitas questões de política no interior das corporações universitárias precisam ser revistas. Paradigmas precisam ser mudados. As novas cabeças pensantes estão em todas as partes, só precisam ser corretamente orientadas a pensar por si.

Nenhum pensamento nasce adulto, pronto. Ele é como uma criança. Nasce pequenino e com o passar do tempo vai sendo moldado de forma a se tornar maduro e bom, pelo menos no campo filosófico, que é o caso ao qual me proponho aqui. Assim também é com os homens. É através de seus pais e educadores em geral que ele vai se aperfeiçoando, sem, no entanto, chegar ao fim de um caminho, posto que o caminho para o conhecimento não conhece limites. Cabe, então, às gerações futuras, dar a esse pensamento as nuances que ele vai precisar, e, assim, evoluindo sempre, esse pensamento “perde”, de algum modo, a sua paternidade”, passando a fazer parte de uma espécie de “patrimônio da humanidade” do pensamento. Entretanto, deve-se procurar manter fidelidade sempre ao seu autor.

Ainda que nossos “filósofos brasileiros” não se considerem como tais, uma coisa é certa: é possível, sim, fazer filosofia no Brasil. Não só no Brasil, mas em qualquer lugar do mundo, conforme dito linhas acima. Se os filósofos brasileiros da atualidade, frise-se bem, da atualidade, não se consideram como filósofos, o problema é mais sério do que se imagina.

Conforme dito linhas acima, não se pode conhecer todos os pensadores de um país para se afirmar não existir aí filósofos ou filosofia. Em nosso país, uns nomes estão tão esquecidos que precisam mesmo de um verdadeiro “filósofo arqueólogo” para descobrir que velhas ossadas um dia puderam abrigar cérebros que produziram grandes obras. Olavo de Carvalho, nascido em Campinas, São Paulo, em 1947, além de ser um dos pensadores brasileiros mais respeitados, vem empreendendo um trabalho extraordinário no sentido de resgatar do esquecimento um nome que representa um marco na história da filosofia brasileira: Mário Ferreira dos Santos, nascido em Tietê, São Paulo, em 1907 e morto em 1968. Até o final dos comentários acerca desse pensador, as palavras de Olavo de Carvalho vão merecer destaque, visto que, sem elas, na íntegra, quaisquer outras palavras não teriam o mesmo efeito.

Mário Ferreira dos Santos ocupa no Brasil “uma posição similar à de Giambatista Vico na cultura napolitana do século XVIII ou de Gottfried Von Leibniz na Alemanha da mesma época: um gênio universal perdido num ambiente provinciano incapaz não só de compreendê-lo, mas de enxergá-lo”. Conta Olavo de Carvalho que ninguém poderia suspeitar que, “num escritório modesto da Vila Olímpia, na verdade uma passagem repleta de livros entre a cozinha e a sala de visitas, um desconhecido discutia em pé de igualdade com outros grandes filósofos de todas as épocas, demolia com meticulosidade cruel as escolas de pensamento mais em moda e sobre seus escombros erigia um novo padrão de inteligibilidade universal”.

Olavo de Carvalho vem empreendendo um criterioso trabalho editorial para republicação das obras de Mário Ferreira, com a revisão de todas as publicações primeiras, visto que estas foram, para usar suas palavras, “um desastre editorial completo”. Mário Ferreira, diz Olavo, “foi um filósofo na acepção mais técnica e rigorosa do termo, um dominador completo das questões debatidas ao longo dos milênios”. Mario Ferreira, continua Olavo de Carvalho, certa feita “fazia uma conferência quando, de repente, pediu desculpas ao auditório e se retirou, alegando que “tivera uma idéia” e precisava anotá-la urgentemente. A idéia era nada mais, nada menos que as teses numeradas destinadas a constituir o núcleo da sua “Filosofia Concreta”, por sua vez o coroamento dos dez volumes iniciais da sua Enciclopédia das Ciências Filosóficas. É de bom alvitre explicar, de forma resumida, o que significa de fato a Filosofia Concreta de Mário Ferreira dos Santos. Ela é “construída geometricamente como uma seqüência de afirmações auto-evidentes e de conclusões exaustivamente fundadas nelas – uma ambiciosa e bem sucedida tentativa de descrever a estrutura geral da realidade tal como tem de ser concebida necessariamente para que as afirmações da ciência façam sentido.” E para finalizar, Olavo de Carvalho escreve: “a filosofia de Mário descerra diante de nossos olhos, de maneira diferenciada e meticulosamente acabada, um edifício doutrinal inteiro que, em Pitágoras – e mesmo em Platão – estava apenas embutido de maneira compacta e obscura”.

Dada a importância da descoberta do Olavo de Carvalho, é imprescindível fechar essa parte do trabalho com uma citação emblemática do próprio Olavo: “Não tenho a menor dúvida de que, quando passar a atual fase de degradação intelectual e moral do país e for possível pensar numa reconstrução, essa obra, mais que qualquer outra, deve tornar-se o alicerce de uma nova cultura brasileira. A obra, em si, não precisa disso: ela sobreviverá muito bem quando a mera recordação da existência de algo chamado “Brasil” tiver desaparecido. O que está em jogo não é o futuro de Mário Ferreira dos Santos: é o futuro de um país que a ele não deu nada, nem mesmo um reconhecimento da boca para fora, mas ao qual ele pode dar uma nova vida no espírito.”

O próprio Olavo de Carvalho é autor da obra Introdução à Teoria dos Quatro Discursos (Rio, Topbooks, 1997), na qual defende que o discurso humano é uma potência única, que se atualiza de quatro maneiras diferentes: a poética, a retórica, a dialética e a analítica (lógica). Segundo o autor, “há nas obras de Aristóteles uma idéia medular, que escapou à percepção de quase todos os seus leitores e comentaristas, da Antiguidade até hoje. Mesmo aqueles que a perceberam – e foram apenas dois, que eu saiba, ao longo dos milênios – limitaram-se a anotá-la de passagem, sem lhe atribuir explicitamente uma importância decisiva para a compreensão da filosofia de Aristóteles.” Se um trabalho dessa envergadura não é fazer filosofia no Brasil, o que vem a ser?

A lista não se esgota aqui, ficando a conclusão deste trabalho para mais adiante. Todavia, os poucos nomes aqui apresentados como sendo homens do pensamento, filósofos em suma, constituem, por si mesmos, um forte argumento para provar a existência de filósofos brasileiros. E, em conseqüência, de filosofia no Brasil.



CONCLUSÃO



Diante de tudo o que acima ficou explicitado, apresenta-se mais plausível inferir que o pensamento filosófico no Brasil vem sendo mais e mais ampliado ao longo dos tempos, alargando seus limites. E, muito embora ainda não possamos falar de uma “Filosofia do Brasil”, já se pode considerar a filosofia no Brasil como sendo uma prática que se reveste de um interesse que vem crescendo dia a dia. Por último, em resumo, pode-se concluir que temos filósofos no Brasil e, em conseqüência, filosofia no Brasil. Entretanto, a tão cobrada “filosofia genuinamente brasileira”, esta está gestando e deverá demorar algum tempo até que o país possa atingir uma maturidade e tradição esperadas.

Nomes do pensamento contemporâneo brasileiro, a exemplo de Luiz Felipe Pondé, estão alertas para essa perspectiva de como se fazer filosofia brasileira, ou no Brasil. Posso exemplificar através de sua obra mais recente, publicada pela Leya, 2010: Contra um mundo melhor: ensaios do afeto, na qual o autor sai da sala de aula e vai às ruas levando ao público “não filósofo”, como ele mesmo chama, a sua filosofia do cotidiano. Só para ilustrar, eu destaco um pequeno trecho do livro: “Esboço uma filosofia do cotidiano. O que é uma filosofia do cotidiano? É uma filosofia que acompanha você no trabalho, na cama, entre as pernas, no carro, no hospital, no cemitério, no celular, no avião, no free shop, no amor, no ódio, no ciúme, na inveja, na gratidão.” (PONDÉ, 2010, 19) Luiz Felipe esqueceu de incluir nessa lista aquele momento em que você é um rei no trono do seu apartamento fazendo suas anotações filosóficas.

A tese central de Palácios sobre o fato de não haver uma filosofia genuinamente brasileira é a falta de diálogo entre os “filósofos” brasileiros. Dito de outra forma, no Brasil um autor publica uma obra, mas não aparece ninguém para “responder”, caracterizando o “diálogo”. Alguns usam argumentos fúteis do tipo “é um texto pedregoso”, “muito longo”, etc., o que não parece espelhar a realidade. Outros fatores, talvez mais sérios, devem ser considerados, como por exemplo, as peculiaridades históricas do Brasil, a forma como a filosofia foi trazida para as universidades brasileiras, a acomodação própria do povo brasileiro, enfim, a nossa própria personalidade.

Assim, diante do que ficou apreendido do texto de Armijos Palácios, pode-se inferir que existem, sim, filósofos no Brasil, muito embora nossos principais nomes, vítimas de uma herança maldita, se sintam em condição de inferioridade. E, em função dessa condição herdada, não tenha havido no Brasil a construção de uma filosofia genuinamente brasileira, visto não haver aqui uma tradição do debate, do diálogo filosófico. Não há respostas às publicações, com deveria haver. Há, sim, uma espécie de letargia onde nossos pensadores não se aceitam como filósofos, mas apenas como professores de filosofia. Talvez eles, na sua maioria, por exercerem apenas o ofício de reproduzir o pensamento alheio, especializando-se em um ou outro filósofo, estejam apenas sendo honestos consigo mesmos.

REFERÊNCIAS:

1. www.olavodecarvalho.org/livros/4discursos.htm - Visitado em 01/11/10;

2. http://www.dicta.com.br/edicoes/edicao-3/mario-ferreira-dos-santos-e-o-nosso-futuro/ - Visitado em 05/11/10.

3. ARMIJOS PALÁCIOS, Gonçalo. De como fazer filosofia sem ser grego, estar morto ou ser gênio. Goiânia: Editora da UFG, 2004. 120 P. – Coleção Filosofia, 1 – Série Ensaios.

4. PONDÉ, Luiz Felipe, 1959. Contra um mundo melhor: ensaios do afeto. In: Imperfeição. – São Paulo: Leya, 2020, 216 pp.
 
 
http://kaloskaiagathos799.blogspot.com/2010/12/filosofia-no-brasil.html